jueves, 17 de julio de 2008

THALASSA¡

THALASSA!
(Traducción de Luz Gomes)
Chegarás primeiro às sereias
que encantam a quantos homens vão a seu encontro.
Homero
Como um rebanho de ondas saltitam
na brancura desta página.
Procuram o vaivém das horas mais

núbeis das três da manhã.
Costumam esconder-se no vestíbulo
do silêncio e ninguém as vislumbra.

Dormem ermas contigo, ainda que nunca
serão tuas. Ao cenário sempre
levam o mesmo papel desde antanho

no poema, que é onde envelhecem,
sem morrer.
Pode-se-lhes invocar nas portas

do sonho, memorando nomes antigos
de náufragos infaustos que planeiam
entre escombros, os que procuram um naco

infalível, algum breve cascalho
de salitre, o ansiado madeirame
de um barco perdido entre a pujança

marítima, sacudindo inúteis
garrafas vazias que hoje repetem
desde a ponta deste lápis: “rilke”,

“rilke”, “rilke”, “rilke”, canto agoirento
das sereias quando assim fustigam
sobre os homens o venal desejo.

Mais além dos párpados sem sonho,
das horas dulcíssimas de um mar
adentro, quando plangem as marinhas

valvas todo refluxo sob a água,
distante, desde exânimes areias,
ó, tu, primeira das Afligidas,

na espiga das ondas cantavas,
e o teu desejo estava no sal
vivo dos nossos íntimos desejos.

Thalassa!, dizias: encrespa a onda
e bate ao vento abrindo ternos rebentos
na rosa náutica. Faz ao dia

mais lúgubre, com ele dulcifica o ar
das ramas altas que aninham pássaros.
Ao solaz, “no mar em acalma e plana”,

ao pairo da alma, é canto inaudito
que repetem impunemente valvas
olvidadas. Sonho inútil que sobe

ao coração do náufrago em lua
rala. É o mais antigo sabor
que tem a sede de salobres águas,

um lenço de vento no que foge
espantada de si a distância.
Thalassa!, enferruja toda a vereda

segredo da chuva, desatando
em vasto mar errante, ondas glaucas.
Como batido de águas zarcas, brune

com seu feitiço todas as nostalgias.
Thalassa!,
é um vento de areia escondido

na camisa de todo poeta,
a mulher do silêncio, só ossos
onde plangem possuídas sereias.

Vede-as agora brincar insones
sob o asa mais profunda do dia.
Nessa hora quando o alcatraz

com seu negro grafiti contorna o céu.
Escuta o que traz a mullente
espuma. Tu és agora Ulisses

que regressa à sua Ítaca depois
de ter amado as castas sereias.
O nascido de ventre que ouviu,

sem morrer, o canto de Aglaofeme,
a da voz bela; a Aglaope,
de rosto formoso, e a Imeropa, mãe

partenia em culpa por desejo de todos.
Escuta atento à branca Leucosia,
a Ligia, a gritadora. Olha grácil

essa “atroz escama de Melusina”
Sobretudo, finge ouvir a música
da venerável Molpe, e guarda

viva a lembrança da pureza
de Partenope, a sutil lascívia
de Pisinoe vencendo ao amante.

Aceita grato o que tenha Redne,
e a Teles toma-a por mulher perfeita.
Como um baptismo assume as palavras

da calma que é pródiga em Telxiepia.
Persuade-te de Telxiope, e volta
à aberta memória dos homens.
Antonio Leal. Do livro inédito: Thalassa.

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